PRIMEIRO ATO
Com Maria Della Costa, a ela e Sandro serei eternamente grata
Há poucos meses comecei a acordar para o fato de
que completaria nesse 26 de dezembro de 2016, nada mais nada menos do que
QUARENTA anos de teatro. Nada mal para quem completou em outubro passado 57
anos de vida. Mas fica melhor ainda quando penso que esses 40 anos são de
teatro profissional. Nunca fiz teatro estudantil, nem teatro amador ou coisa
que o valha – sem preconceito ou desprezo – mas entrei para o teatro pela porta
da frente. Como aliás em tudo o que fiz na vida, coisas de quem nasceu com um
crachá invisível.
Cheguei ao Rio de Janeiro em dezembro de 1976, ano
da separação dos meus pais, primeiro Natal com os pais separados, com minha mãe
e meus irmãos, como sempre fazíamos desde 1972. Prestaria vestibular em janeiro
e havia decidido me inscrever apenas no Cesgranrio, ou passava no Rio ou não
faria faculdade em 1977. Não pude escolher teatro como primeira alternativa, o
Cacique não bancaria uma filha de 17 anos no Rio de Janeiro fazendo faculdade de
teatro. A paixão pelas palavras, pela escrita e uma curiosidade ímpar me
levaram ao jornalismo, até hoje minha profissão primeira e aquela que coloco
nos formulários da vida.
Sem ter pai rico, sem ter sobrenome famoso e sendo
apenas uma estudante formada no Colégio São José de Santos, escola católica,
particular e burguesa como convém a um país laico no qual o ensino público se
perdeu, minhas referências no Rio de Janeiro, ex-capital do Império e da
República, mas distante, à época de ser o balneário falido de hoje, eram
inexistentes. Trazia comigo apenas um número de telefone: o de Maria Della
Costa. Em julho de 1975 havia visto Golpe Sujo, com Maria e Jardel Filho, numa
encenação de José Renato, no Teatro da Galeria, entrevistei Jardel para o
jornalzinho que fazia no colégio e ao sair conversei com Maria, disse a ela da
minha vontade de fazer teatro. Ela pensou que eu quisesse ser atriz, mas Sandro
– ao lado – entendeu imediatamente que o que eu buscava estava atrás das
cortinas. Eles iriam se instalar por um tempo no Rio, Maria integraria no ano
seguinte o elenco da novela Estúpido Cupido, de Mário Prata e se dispuseram a
me ajudar. Deixaram comigo o tal número de telefone, do ap que tinham na
Princesa Isabel e que durante quase dois anos seria a minha segunda casa. Foi
esse telefone que um ano e meio depois antecipou minha entrada no mundo do
teatro.
Liguei para Maria para desejar Feliz Natal, dizer
que já estava no Rio e gostaria de vê-los. Sandro pegou o telefone – ele decidia
a agenda de Maria, em bom marido-produtor – e imediatamente marcou um encontro comigo
para a tarde de domingo, 26 de dezembro. Na segunda eles fariam a primeira
leitura do texto que iriam montar, eu poderia estar presente e ele acenava com
a possibilidade de eu ser assistente de produção. Era muita areia para o meu
caminhãozinho como dizia na época minha amiga Sumára Louise.
E foi assim que tudo começou...Passei no
vestibular. Fiquei no Rio de Janeiro e antes mesmo de começar as aulas no
Centro Unificado Profissional – Faculdade da Cidade pouco tempo depois –
estreava no teatro como assistente de produção do maior produtor do teatro
brasileiro, Sandro Polônio, numa companhia com mais tempo de vida do que eu
mesma.
A peça não era lá grande coisa, A mala, uma comédia
em dois atos, escrita pelo dramaturgo argentino Julio Maurício, que havia feio
sucesso em sua adaptação para o cinema argentino em 1971, com o nome de La
valija com Luis Sandrini e Malvina Pastorino no elenco. No Brasil a peça foi
uma jogada de marketing do Sandro, Maria acabaria a novela Estúpido Cupido,
onde fazia par com Leonardo Vilar, e os altos índices de audiência anunciavam a
perspectiva de fazer uma tournée nacional de 120 dias e depois, talvez, quem
sabe, estrear no Rio e em Sampa. Claro que essa é a visão que tenho hoje, mas
mesmo tendo sido A Mala “um vôo menor de um dos pássaros de brilho maior do
teatro brasileiro” foi graças a essa montagem que vi meu sonho virar realidade.
O diretor de "A Mala" era um nome para mim desconhecido, Luiz Ernesto
Imbassahy, ex-aluno da Escola de Teatro da FEFIERJ – hoje UNIRIO, no elenco
além de Maria e Leo Vilar, havia ainda um jovem ator, Rômulo Marinho Júnior, com
quem me encontraria anos depois na equipe de produção de Piaf. Depois de passar
o verão ensaiando no Rio, eles partiram em turnê e eu comecei minhas aulas,
atendendo sempre que possível os pedidos de Sandro para ir à SBAT, à Polícia
Federal – sim à censura – e começar a preparar a estreia no Rio de Janeiro,
marcada para dezembro de 1977. Ao mesmo tempo me preparava para fazer o
vestibular em 1978 e entrar para a Escola de Teatro da FEFIERJ – a UNIRIO –
cuja sede ainda era na antiga sede da UNE na Praia do Flamengo. Foi assim que
conheci Claudia Richer – amiga desde então – na fila dos testes de habilidade
específica, sim eu precisaria passar por um teste de interpretação. Na banca só
feras...Roberto de Cleto, Bárbara Heliodora, Pernambuco de Oliveira...diga ai
se esqueci alguém Claudia Richer.
Passei. D’us sabe como, mas passei. E ai fazia duas
faculdades. Jornalismo em Jacarepaguá, pela manhã. Teatro, no Flamengo à noite.
Maria e Sandro me contrataram para bater texto com Maria que faria Te contei,
novela de Cassiano Gabus Mendes e ainda comecei a preparar a pré-produção da
próxima peça que seria um outro golpe de mestre de Sandro: Agora eu conto,
texto de Cassiano Gabus Mendes, para Maria Della Costa, Luís Gustavo e Maria
Claúdia, com direção de Régis Cardoso – Lea Penteado está ai como testemunha da
história – com Luís Carlos Maciel de assistente de direção, anos depois é que
fui entender o que significava Maciel ser assistente de Régis. Ensaios na Casa
de Cultura Laura Alvim, com a própria ainda viva e fazendo as honras da casa. A
estreia seria em Vitória, no Espírito Santo e dessa vez Sandro me deu um grande
presente: eu saía da faculdade às sextas-feiras direto para o aeroporto – e com
tudo pago pela produção – ia ao encontro deles na cidade onde estivessem se
apresentando. O Rio de Janeiro fervia com a garotada do Asdrúbal e eu fazia
tournée com Maria Della Costa pelo Brasil. Isso define uma maneira de ver e de
fazer teatro.
Com Rosamaria Murtinho, carinho e admiração
Mas fazer duas faculdades e trabalhar estava
impossível...ainda mais viajando a cada final de semana. No final de 1978
primeira decisão importante: continuar com o jornalismo e deixar a Escola de
Teatro. Precisava estagiar como estudante de jornalismo e foi assim que meu
caminho cruzou com o de Rosamaria Murtinho – a quem conhecia dos camarins da
vida desde A Feira do Adultério em 1975. Fui entrevistá-la em sua casa, ainda
na Paula Freitas, a casa de São Conrado estava em construção, conversa vai,
conversa vem, ela me perguntou se eu continuava trabalhando como Maria e
Sandro, contei a história e na mesma hora ela me disse: tenho um emprego para
você. Ligou para Carlos Murtinho, que morava alguns andares abaixo, e em dez
minutos estava empregada e dessa vez como produtora executiva, administradora e
assessora de imprensa da peça A Fila de Israel Horovitz, numa tradução de
Carlos Eduardo Novaes, com estreia marcada para dali a três semanas e uma
encrenca sem fim...assim entrou Beyla Genauer em minha vida...
Com Beyla Genauer, minha mãe judia
Daí para frente eu não parei mais...fui vender
programas para Norma e Cecil Thiré durante o megassucesso de A resistência de
Maria Adelaide Amaral, no Teatro Glaúcio Gill. Fui administrar o Teatro SENAC
no período em que Beyla se estabeleceu por lá e montamos As Avestruzes com
direção do Luís Carlos Ripper. Uma coisa leva a outra. Um trabalho chama outro.
Até bilheteira do seu Américo Leal no Teatro Rival eu fui durante uma temporada
de Rio de Cabo a Rabo, com Djenane Machado, Maria Cristina Gatti, Fafá Valença,
e uma galera no elenco, todos ai de testemunha...
Com Clara Nunes, amor maior que me deu de presente Bibi
Até que um dia, o teatro me levou à música. Lourdes
– camareira de Rosamaria Murtinho em A Fila – consegue um convite para que eu
assista Clara Mestiça no Teatro Clara Nunes. Dirigido por ninguém menos que
Bibi Ferreira e esse dia 21 de março de 1981 ficará para sempre marcado em
minha vida, um sábado que começara em ressaca vai se terminar com um encontro
marcado para o domingo, e de lá saio como assessora de imprensa da Clara Nunes.
Dois anos depois, num dia 21 de março de 1983 nasceria meu filho, Pedro, Clara em coma desde o dia 5 de março após um choque anafilático numa cirurgia banal de varizes e morreria no dia 2 de abril de 1983, deixando-me
completamente perdida aos 23 anos de idade, com um filho nos braços, sem a
minha melhor amiga e last but not least desempregada...
Mas quem teve Clara Nunes na vida não fica à
míngua...família segura daqui, segura dali, vou me instalar em Santos na casa
da mamãe por um tempo, me recupero do susto, crio forças enquanto a cria
cresce, volto para o Rio e me instalo na casa da minha comadre Angela Ro Ro,
trago Pedro de mala e cuia, e de repente muda tudo para que eu possa partir com
a tournée de Piaf para o nordeste do Brasil. Convite feito por Bibi com o aval
de Mercedes Alverga e Pedro Carlos Rovai...
Serei obrigada a fazer um INTERVALO...continuo mais
pois Charles Aznavour não vai me esperar!
SEGUNDO ATO
Com minha Bi amada e querida, ela fez de mim a profissional que sou
Com Claudia Raia, ela com 18 e eu com 25 anos
Com Nathalia Timberg, prova maior de que a generosidade existe
Com Tônia Carrero, a mais bela das belas e a melhor companheira de tournée
Com Bibi Ferreira, D'us no céu e Bibi na terra, por vezes foi o inverso
Com Ariane Mnouchkine, a feiticeira dos meus mais belos sonhos de teatro
Minha tese ou de como o teatro me fez uma sorbonnarde
Dois volumes para falar de Produção Teatral
Georges Banu, Emmanuel Wallon, Robert Abirached, Jean-Pierre Ryngaert e Sábato Magaldi
Théâtre du Soleil com Ariane Mnouchkine folheando a tese
25 de janeiro de 2007
Com Jean-Pierre Ryngaert, meu orientador, sorry periferia
De como o teatro me levou a Cluj, capital da Transilvânia
Meus 54 anos comemorados com Wallon e Banu chez Bernard Faivre D'Arcier
Com Béatrice Picon-Vallin
Com Jostette Féral
Com Françoise Benhamou, a papisa da economia da cultura
Com Emmanuel Wallon preparando agora o segundo post-doc
De olho no futuro Ou como o teatro colocou Paris aos meus pés.
Vista da janela da minha sala