lundi 26 décembre 2016

40 anos de teatro, bravo Deolinda

PRIMEIRO ATO
Com Maria Della Costa, a ela e Sandro serei eternamente grata

Há poucos meses comecei a acordar para o fato de que completaria nesse 26 de dezembro de 2016, nada mais nada menos do que QUARENTA anos de teatro. Nada mal para quem completou em outubro passado 57 anos de vida. Mas fica melhor ainda quando penso que esses 40 anos são de teatro profissional. Nunca fiz teatro estudantil, nem teatro amador ou coisa que o valha – sem preconceito ou desprezo – mas entrei para o teatro pela porta da frente. Como aliás em tudo o que fiz na vida, coisas de quem nasceu com um crachá invisível.
Cheguei ao Rio de Janeiro em dezembro de 1976, ano da separação dos meus pais, primeiro Natal com os pais separados, com minha mãe e meus irmãos, como sempre fazíamos desde 1972. Prestaria vestibular em janeiro e havia decidido me inscrever apenas no Cesgranrio, ou passava no Rio ou não faria faculdade em 1977. Não pude escolher teatro como primeira alternativa, o Cacique não bancaria uma filha de 17 anos no Rio de Janeiro fazendo faculdade de teatro. A paixão pelas palavras, pela escrita e uma curiosidade ímpar me levaram ao jornalismo, até hoje minha profissão primeira e aquela que coloco nos formulários da vida.
Sem ter pai rico, sem ter sobrenome famoso e sendo apenas uma estudante formada no Colégio São José de Santos, escola católica, particular e burguesa como convém a um país laico no qual o ensino público se perdeu, minhas referências no Rio de Janeiro, ex-capital do Império e da República, mas distante, à época de ser o balneário falido de hoje, eram inexistentes. Trazia comigo apenas um número de telefone: o de Maria Della Costa. Em julho de 1975 havia visto Golpe Sujo, com Maria e Jardel Filho, numa encenação de José Renato, no Teatro da Galeria, entrevistei Jardel para o jornalzinho que fazia no colégio e ao sair conversei com Maria, disse a ela da minha vontade de fazer teatro. Ela pensou que eu quisesse ser atriz, mas Sandro – ao lado – entendeu imediatamente que o que eu buscava estava atrás das cortinas. Eles iriam se instalar por um tempo no Rio, Maria integraria no ano seguinte o elenco da novela Estúpido Cupido, de Mário Prata e se dispuseram a me ajudar. Deixaram comigo o tal número de telefone, do ap que tinham na Princesa Isabel e que durante quase dois anos seria a minha segunda casa. Foi esse telefone que um ano e meio depois antecipou minha entrada no mundo do teatro.
Liguei para Maria para desejar Feliz Natal, dizer que já estava no Rio e gostaria de vê-los. Sandro pegou o telefone – ele decidia a agenda de Maria, em bom marido-produtor – e imediatamente marcou um encontro comigo para a tarde de domingo, 26 de dezembro. Na segunda eles fariam a primeira leitura do texto que iriam montar, eu poderia estar presente e ele acenava com a possibilidade de eu ser assistente de produção. Era muita areia para o meu caminhãozinho como dizia na época minha amiga Sumára Louise.
E foi assim que tudo começou...Passei no vestibular. Fiquei no Rio de Janeiro e antes mesmo de começar as aulas no Centro Unificado Profissional – Faculdade da Cidade pouco tempo depois – estreava no teatro como assistente de produção do maior produtor do teatro brasileiro, Sandro Polônio, numa companhia com mais tempo de vida do que eu mesma.
A peça não era lá grande coisa, A mala, uma comédia em dois atos, escrita pelo dramaturgo argentino Julio Maurício, que havia feio sucesso em sua adaptação para o cinema argentino em 1971, com o nome de La valija com Luis Sandrini e Malvina Pastorino no elenco. No Brasil a peça foi uma jogada de marketing do Sandro, Maria acabaria a novela Estúpido Cupido, onde fazia par com Leonardo Vilar, e os altos índices de audiência anunciavam a perspectiva de fazer uma tournée nacional de 120 dias e depois, talvez, quem sabe, estrear no Rio e em Sampa. Claro que essa é a visão que tenho hoje, mas mesmo tendo sido A Mala “um vôo menor de um dos pássaros de brilho maior do teatro brasileiro” foi graças a essa montagem que vi meu sonho virar realidade. O diretor de "A Mala" era um nome para mim desconhecido, Luiz Ernesto Imbassahy, ex-aluno da Escola de Teatro da FEFIERJ – hoje UNIRIO, no elenco além de Maria e Leo Vilar, havia ainda um jovem ator, Rômulo Marinho Júnior, com quem me encontraria anos depois na equipe de produção de Piaf. Depois de passar o verão ensaiando no Rio, eles partiram em turnê e eu comecei minhas aulas, atendendo sempre que possível os pedidos de Sandro para ir à SBAT, à Polícia Federal – sim à censura – e começar a preparar a estreia no Rio de Janeiro, marcada para dezembro de 1977. Ao mesmo tempo me preparava para fazer o vestibular em 1978 e entrar para a Escola de Teatro da FEFIERJ – a UNIRIO – cuja sede ainda era na antiga sede da UNE na Praia do Flamengo. Foi assim que conheci Claudia Richer – amiga desde então – na fila dos testes de habilidade específica, sim eu precisaria passar por um teste de interpretação. Na banca só feras...Roberto de Cleto, Bárbara Heliodora, Pernambuco de Oliveira...diga ai se esqueci alguém Claudia Richer.
Passei. D’us sabe como, mas passei. E ai fazia duas faculdades. Jornalismo em Jacarepaguá, pela manhã. Teatro, no Flamengo à noite. Maria e Sandro me contrataram para bater texto com Maria que faria Te contei, novela de Cassiano Gabus Mendes e ainda comecei a preparar a pré-produção da próxima peça que seria um outro golpe de mestre de Sandro: Agora eu conto, texto de Cassiano Gabus Mendes, para Maria Della Costa, Luís Gustavo e Maria Claúdia, com direção de Régis Cardoso – Lea Penteado está ai como testemunha da história – com Luís Carlos Maciel de assistente de direção, anos depois é que fui entender o que significava Maciel ser assistente de Régis. Ensaios na Casa de Cultura Laura Alvim, com a própria ainda viva e fazendo as honras da casa. A estreia seria em Vitória, no Espírito Santo e dessa vez Sandro me deu um grande presente: eu saía da faculdade às sextas-feiras direto para o aeroporto – e com tudo pago pela produção – ia ao encontro deles na cidade onde estivessem se apresentando. O Rio de Janeiro fervia com a garotada do Asdrúbal e eu fazia tournée com Maria Della Costa pelo Brasil. Isso define uma maneira de ver e de fazer teatro.
Com Rosamaria Murtinho, carinho e admiração

Mas fazer duas faculdades e trabalhar estava impossível...ainda mais viajando a cada final de semana. No final de 1978 primeira decisão importante: continuar com o jornalismo e deixar a Escola de Teatro. Precisava estagiar como estudante de jornalismo e foi assim que meu caminho cruzou com o de Rosamaria Murtinho – a quem conhecia dos camarins da vida desde A Feira do Adultério em 1975. Fui entrevistá-la em sua casa, ainda na Paula Freitas, a casa de São Conrado estava em construção, conversa vai, conversa vem, ela me perguntou se eu continuava trabalhando como Maria e Sandro, contei a história e na mesma hora ela me disse: tenho um emprego para você. Ligou para Carlos Murtinho, que morava alguns andares abaixo, e em dez minutos estava empregada e dessa vez como produtora executiva, administradora e assessora de imprensa da peça A Fila de Israel Horovitz, numa tradução de Carlos Eduardo Novaes, com estreia marcada para dali a três semanas e uma encrenca sem fim...assim entrou Beyla Genauer em minha vida... 

Com Beyla Genauer, minha mãe judia

Daí para frente eu não parei mais...fui vender programas para Norma e Cecil Thiré durante o megassucesso de A resistência de Maria Adelaide Amaral, no Teatro Glaúcio Gill. Fui administrar o Teatro SENAC no período em que Beyla se estabeleceu por lá e montamos As Avestruzes com direção do Luís Carlos Ripper. Uma coisa leva a outra. Um trabalho chama outro. Até bilheteira do seu Américo Leal no Teatro Rival eu fui durante uma temporada de Rio de Cabo a Rabo, com Djenane Machado, Maria Cristina Gatti, Fafá Valença, e uma galera no elenco, todos ai de testemunha...
Com Clara Nunes, amor maior que me deu de presente Bibi

Até que um dia, o teatro me levou à música. Lourdes – camareira de Rosamaria Murtinho em A Fila – consegue um convite para que eu assista Clara Mestiça no Teatro Clara Nunes. Dirigido por ninguém menos que Bibi Ferreira e esse dia 21 de março de 1981 ficará para sempre marcado em minha vida, um sábado que começara em ressaca vai se terminar com um encontro marcado para o domingo, e de lá saio como assessora de imprensa da Clara Nunes. Dois anos depois, num dia 21 de março de 1983 nasceria meu filho, Pedro, Clara em coma desde o dia 5 de março após um choque anafilático numa cirurgia banal de varizes e morreria no dia 2 de abril de 1983, deixando-me completamente perdida aos 23 anos de idade, com um filho nos braços, sem a minha melhor amiga e last but not least desempregada...
Mas quem teve Clara Nunes na vida não fica à míngua...família segura daqui, segura dali, vou me instalar em Santos na casa da mamãe por um tempo, me recupero do susto, crio forças enquanto a cria cresce, volto para o Rio e me instalo na casa da minha comadre Angela Ro Ro, trago Pedro de mala e cuia, e de repente muda tudo para que eu possa partir com a tournée de Piaf para o nordeste do Brasil. Convite feito por Bibi com o aval de Mercedes Alverga e Pedro Carlos Rovai...

Serei obrigada a fazer um INTERVALO...continuo mais pois Charles Aznavour não vai me esperar!

SEGUNDO ATO
Com minha Bi amada e querida, ela fez de mim a profissional que sou

Com Claudia Raia, ela com 18 e eu com 25 anos

Com Nathalia Timberg, prova maior de que a generosidade existe

Com Tônia Carrero, a mais bela das belas e a melhor companheira de tournée

Com Bibi Ferreira, D'us no céu e Bibi na terra, por vezes foi o inverso

Com Ariane Mnouchkine, a feiticeira dos meus mais belos sonhos de teatro

Minha tese ou de como o teatro me fez uma sorbonnarde

Dois volumes para falar de Produção Teatral

Georges Banu, Emmanuel Wallon, Robert Abirached, Jean-Pierre Ryngaert e Sábato Magaldi

Théâtre du Soleil com Ariane Mnouchkine folheando a tese
25 de janeiro de 2007

 Com Jean-Pierre Ryngaert, meu orientador, sorry periferia

De como o teatro me levou a Cluj, capital da Transilvânia

Meus 54 anos comemorados com Wallon e Banu chez Bernard Faivre D'Arcier

Com Béatrice Picon-Vallin
Com Jostette Féral

 
Com Françoise Benhamou, a papisa da economia da cultura

Com Emmanuel Wallon preparando agora o segundo post-doc

De olho no futuro Ou como o teatro colocou Paris aos meus pés.
Vista da janela da minha sala

samedi 17 décembre 2016

Ir ao Soleil é reencontrar o grande amor


7 de dezembro de 2016, quarta-feira, cheguei do Brasil ontem e hoje já tomo o rumo da Cartoucherie de Vincennes. Maior que paixão, só amor. Paixão passa, amor é para sempre. Por isso é impossível entrar no ônibus – primeiro o 46 e depois o 112 – para ir à Cartoucherie de Vincennes, sede do Théâtre du Soleil, sem que um filme de quase 17 anos passe pela minha cabeça. Lembro-me como se fosse hoje da minha primeira ida ao Théâtre du Soleil em maio de 2000. Atravessei Paris de Oeste a Leste, peguei a linha 1 do metrô na estação Charles de Gaulle-Étoile para descer na estação final, Château de Vincennes. Era uma quinta-feira, eu tinha o coração na boca, ia assistir Tambours sur la digue, mas mais do que isso, realizaria um sonho – conhecer Ariane Mnouchkine e começaria a preparar a realização de outro sonho – fazer um doutorado na Sorbonne tendo o modelo de produção do Théâtre du Soleil como objeto de estudo.
Depois dessa primeira vez perdi a conta de quantas vezes fui à Cartoucherie, mas foram muitas. Inúmeras. Tantas, que desisti de contar. Só uma peça – Le Dernier caravansérail – eu assisti 55 vezes, vi a estréia e a última apresentação na Cartoucherie, e ainda fui a Quimper na Bretanha assistir aos espetáculos apresentados lá.
Entre setembro de 2001 e fevereiro de 2007 escrevi uma dissertação de Mestrado e uma tese de Doutorado sobre eles, tive a honra e o privilégio de fazer a maior parte da pesquisa no próprio teatro. Logo depois eles doaram o acervo para a Biblioteca Nacional François Mitterrand e, desde então, quem pesquisa sobre o Soleil não teve a mesma chance de acessar os documentos sur place e contar com a ajuda e o carinho de Maria Adroher, minha catalã preferida, para fazer as cópias necessárias.
Em menos de meia hora revi no ônibus as últimas duas décadas da minha vida. E ao chegar naquele portão azul, naquele lugar onde são fabricados artesanalmente os meus mais belos sonhos teatrais, abri um largo sorriso enquanto meus olhos não esconderam as lágrimas...um ano, nove meses e oito dias depois da última visita estou de volta, e de quebra, para ver a mais recente criação da trupe – Une chambre em Inde.
Porque quem nunca veio à Cartoucherie – mesmo que tenha visto as apresentações do Théâtre du Soleil pelo mundo – NÃO sabe que vir à casa do Soleil é muito mais do que ver um espetáculo de teatro, é redescobrir o teatro. No meu caso é mais do que isso, é renovar a crença no teatro e reencontrar meu grande amor.


Depois do primeiro sorriso, das primeiras lágrimas hora de levantar a cabeça e entrar com o pé direito na Cartoucherie de Vincennes porque eu sei tudo o me espera atrás desse portão azul...


Une chambre en Inde na parede escrito em branco na mesma parede de tijolinhos onde já li Tambous sur la Digue, Et soudain des nuits d’éveil, Le Dernier Caravansérail, Les Éphémères, Les Naufragés du Fol Espoir e Macbeth...entre maio de 2000 e dezembro de 2016 eu fui abençoada pelos deuses do teatro com sete criações de Ariane Mnouchkine...e a cada vez que aqui entrei vi TEATRO da melhor qualidade. 


As boas surpresas em minha vida parisiense parecem não ter fim. Chego para retirar meu ingresso, reservado há meses, e recebo esse presente: um convite. E já com lugar marcado. Um gesto de carinho, de atenção, de respeito, de amizade, que me toca. Muito. Faço parte de uma corrente que acredita que em TEATRO “de graça, não tem graça”, como diz Marcio Meirelles, por isso ao longo desses anos me habituei a comprar meus ingressos para ver os espetáculos do Théâtre du Soleil, e isso já gerou as mais diversas histórias. Quem me conhece sabe que posso até tentar ajudar para conseguir um ingresso para o Soleil, mas PAGO, não peço convite para ninguém, o Soleil é uma trupe independente, não é um teatro público, apesar da subvenção ministerial que recebem, cerca de 70% do orçamento deles vem da bilheteria e mesmo quando fazem muito sucesso por vezes são obrigados a interromper a temporada para não entrar no vermelho. Com o preço dos ingressos bem abaixo da média dos teatros privados de Paris, para Une Chambre en Inde o preço da inteira é de 40 € / para os grupos de mais de 10 pessoas e desempregados é de 30 euros e para estudantes de menos de 26 anos é de 20 €, se você vem a Paris e quer ir ao Soleil prepare seu dinheirinho, será muito bem empregado. 























jeudi 24 novembre 2016


Paris eu tô chegando...